Estadão – 15/02/2017
Eliana Cassales Tosi, do Fórum Criminal da Barra Funda em São Paulo, considera que ainda que a fala do historiador e comentarista no ‘Jornal da Cultura’ tenha conteúdo mordaz ‘ela pode se enquadrar dentro do direito de crítica e exercício da liberdade de expressão e opinião’
A juíza Eliana Cassales Tosi, da 30.ª Vara Criminal do Fórum da Barra Funda, em São Paulo, absolveu sumariamente o historiador Marco Antonio Villa no processo em que foi acusado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de cometer os crimes de calúnia, difamação e injúria.
Na queixa-crime os advogados de Lula acusavam Villa de ter usado parte do primeiro bloco do ‘Jornal da Cultura’, exibido pela TV Cultura dia 20 de julho de 2015, para ‘enxovalhar a reputação, a boa imagem e a honra do ex-presidente, fazendo afirmações mentirosas sobre sua trajetória política, conduta e identidade’. Além disso, segundo a defesa do petista, o comentarista imputou a Lula a prática de condutas criminosas, ‘inclusive quando no exercício da Presidência da República’.
Justificando a sentença com que absolveu sumariamente o historiador e comentarista de TV e rádio, a magistrada observa que da leitura dos autos conclui-se que o fato narrado ‘evidentemente não constitui crime’.
Segundo a juíza Eliana Cassales Tosi, ainda que a fala de Villa tenha conteúdo mordaz, ela pode se enquadrar dentro do direito de crítica e exercício da liberdade de expressão e opinião. Para ela, as ofensas a Lula ‘não são de cunho pessoal, não atacam a pessoa natural e seus atributos, mas sim a atuação política, a administração que teria sido exercida pela pessoa pública’.
“Não se pode perder de vista ainda que, diante do cenário político vivido no Brasil, a fala do querelado (Villa), de alguns minutos, ainda que considerada de densidade elevada e conteúdo ofensivo, não teria extrapolado opinião e crítica à atuação política do querelante (Lula), enquanto administrador público, não tendo o condão de macular a reputação do autor”, decidiu a juíza.
De acordo com o advogado constitucionalista e criminalista Adib Abdouni, essa decisão judicial ‘corrobora a tese das grandes e consolidadas democracias, de que cidadãos que se dedicam à política, à vida pública, estão sujeitos a ter seus atos analisados pela imprensa, sem que isso constitua crime’.
“Ou seja, mesmo a mais alta autoridade do país (no caso, tratava-se de um ex-presidente) deve submeter seus atos enquanto administrador público às críticas da imprensa.”