ConJur – Consultor Jurídico – 14/01/2020 –
Até então desconhecido fora de sua região, o deputado estadual de Santa Catarina Jessé Lopes (PSL-SC) virou protagonista de uma polêmica que vem ganhando contornos nacionais.
Ao criticar a iniciativa de um coletivo feminista que buscava distribuir tatuagens temporárias com a frase “Não é não”, durante o Carnaval, o deputado confundiu alhos com bugalhos.
Lopes afirmou que ser “assediada” é um “direito” da mulher, e declarou que ações como a proposta pelo grupo feminista são “inveja de mulheres frustradas por não serem assediadas nem em frente a uma construção civil”.
Lopes foi muito criticado por homens e mulheres e, para se defender, ainda expôs uma jovem que o criticou nas redes sociais. “Nesta foto, não parece que você está muito preocupada com assédio. Inclusive, você é muito bonita. Parabéns!”
Para o doutor em Direito Penal pela USP e professor da EDB (Escola de Direito do Brasil) João Martinelli, o deputado não cometeu crime, mas se confundiu ao criticar a campanha.
“Pelo que li, ele não cometeu o crime de assédio sexual. O crime de assédio sexual consiste em fazer uso de uma posição de superioridade no trabalho, por exemplo, para obter favor sexual. Dizer que uma pessoa é bonita não configura assédio sexual. O elogio grosseiro também não é assédio sexual. Mas pode ser importunação sexual agarrar uma mulher e obrigá-la a beijar ou passar a mão em partes do corpo sem consentimento”, esclarece.
Já para a advogada Mônica Sapucaia Machado, professora da EDB e especialista em compliance de gênero, a abordagem respeitosa não é crime, mas sim a insistência após uma negativa.
“Me parece que é isso que a campanha defende. Não é não. Isto é, após receber um não, o agente da abordagem indesejada não mais pressiona a abordada. Apenas isso, algo que deveria ser óbvio, que não impede a paquera, não atrapalha encontros e namoros, e sim respeita o direito de cada um e cada uma de não ser importunado por alguém”, argumenta.
Adib Abdouni, advogado criminalista e constitucionalista, lembra que o flerte e o galanteio, evidentemente, estão liberados no Carnaval. Segundo ele “faz parte da festa” — desde que mantido o respeito pela pessoa galanteada. “Contudo, a lei — aplicável a qualquer pessoa e a qualquer tempo — não tolera condutas exacerbadas e abusivas, previamente definidas pelo ordenamento jurídico como antissociais”, destaca.
Abdouni também ressalta a mudança no Código Penal em 2018 que tornou crime as práticas de importunação sexual — antes tidas como contravenção penal. “Por conta disso, aquele que praticar contra alguém e sem a sua concordância ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiros — como um toque desrespeitoso em partes íntimas ou um beijo não-consensual — estará sujeito a penas de 1 a 5 anos de reclusão”, adverte.
O artigo 216-A do Código Penal estabelece uma pena de um a dois anos de prisão para o crime de assédio sexual.
Já o crime de importunação sexual é previsto no artigo 215-A, e envolve a prática de ato libidinoso, como o beijo forçado. A pena neste caso é de um a cinco anos de prisão, se o fato não constituir crime mais grave. A depender do ato libidinoso praticado contra a vítima, pode configurar o crime de estupro, previsto no artigo 213 do Código Penal.
Por fim, no caso de a vítima estar inconsciente, por qualquer que seja o motivo, e alguém se aproveitar para dela abusar sexualmente, pode incorrer no crime de estupro de vulnerável (artigo 217-A).